quarta-feira, maio 27, 2009

Bridging the Personal and the Political: Practices for a Liberation Psychology, by Geraldine Moane

"A ponte entre o individual e o político: Práticas para uma Psicologia de Libertação", de Geraldine Moane

O estudo em questão, de 2003, refere-se ao contexto e principais acontecimentos ocorridos na Irlanda: a recorrente colonização pelos Britânicos que envolveu a apropriação de terras e bens, exclusão no poder político, tentativas de erradicação da linguagem e cultura; a segregação da Irlanda em República da Irlanda e Irlanda do Norte; mudanças sociais e políticas resultando em movimentos activistas de vária ordem.
Este artigo, através de investigação literária procura compreender as condições e padrões associados com a opressão e os processos e práticas que ocorrem na libertação. Esta investigação recorre a diversas fontes sobre opressão e libertação, aspectos psicológicos do racismo, homofobia, pobreza e outras dimensões de opressão.

Psicologia da Libertação

É importante referir que a psicologia da Libertação foca sobretudo as condições sociais, particularmente condições sociais opressivas como fonte de problemas psicológicos e enfatiza o empowerment e a transformação social como objectivos de intervenção. De acordo com Bulhan (1985), um tema central da psicologia da Libertação é a necessidade de focar o colectivo invés do individual. Tal é reafirmado por Starhawk (1987): "A psicologia da Libertação foca primariamente as comunidades de onde vimos e criámos. A nossa história colectiva é tão importante como a nossa história individual. A psicologia da Libertação tem uma maior preocupação em como as estruturas de poder modelam e aproximam-nos, invés dos eventos individuais da nossa infância... a psicologia da libertação tem uma maior preocupação sobre as maneiras de criar uma cura e mudança colectiva." Mais, Martín-Baró referiu que a raiz das causas de opressão tem como base a estrutura de uma sociedade - política, económica e cultural. São estas as estruturas que originam a violência, pobreza, stress, discriminação e preconceito - todas estas manifestações de opressão. Desta forma, a psicologia da Libertação terá como objectivo transformar as estruturas sociais de opressão através de acções colectivas.
Outro elemento chave da psicologia da Libertação é a compreensão de que a internalização de opressão é um componente importante na manutenção desta e, um elemento essencial na ligação entre as condições sociais de opressão e os padrões psicológicos associados com esta. Desta forma, certos padrões psicológicos que claramente se relacionam com a opressão e que têm as suas origens em condições sociais de degradação e impotência, actuam como uma barreira para a acção e mantêm a opressão. Daí que, a Libertação deve envolver a transformação dos padrões psicológicos talcomo das condições socais associadas com a opressão.
Naturalmente que os processos e práticas que podem ocorrer da psicologia da Libertação irão variar consoante o contexto em que esta é necessária. A opressão é estruturada de diferentes formas de acordo com os diversos grupos e é experenciada de diferentes maneiras entre os diversos grupos, os quais irão desenvolver diferentes estratégias de transformação dos padrões de opressão em questão.
É necessário, de igual modo, enfatizar que a psicologia da Libertação acompanha aqueles que vivem em condições de opressão, ou seja, trabalham e mantém-se lado a lado os indivíduos que estão sujeitos às condições de opressão e procuram desenvolver relações colaborativas que reconheçam as diferenças de poder a que estão sujeitos (Comas-Diaz et al., 1998).




Sabendo assim um pouco do que a psicologia da Libertação trata e os seus objectivos, este artigo procura aprofundar o desenvolvimento da psicologia da Libertação de três formas:
- Uma análise social que procura perceber as condições sociais associadas com a opressão;
- A identificação de padrões psicológicos associados a opressão;
- Processos e práticas envolvidas na libertação.

Análise Social

O objectivo da análise social, como já foi referido, é identificar as condições sociais associadas com a opressão e de que maneira essas condições estão estruturadas na sociedade. Esta análise identificou 6 padrões que se pensam ser relevantes do ponto de vista da psicologia da Libertação: violência, exclusão política, exploração económica, controlo da sexualidade, controlo cultural e fragmentação. Estes padrões são descritos como mecanismos de controlo visto terem um efeito em manter o domínio através da concentração de recursos no topo da hierarquia, impondo barreiras à mudança e através da internalização da opressão (Fanon, 1967; Bulhan, 1985; Miller, 1986; Jackson and Jones, 1998; Walby, 1997).




Padrões psicológicos associados com a opressão (Internalização da Opressão)

Padrões psicológicos associados com a opressão incluem tensão e ambivalência numa variedade de áreas (sexualidade, espiritualidade, criatividade), sentimentos de inferioridade, desvalorização, emoções intensas e frequentemente negativas (medo, impotência, raiva e vergonha), competição e desconfiança. É possível que para muitos indivíduos o culminar da opressão leve a vulnerabilidade psicológica, particularmente a stress negativo e "loucura" e, conduza ao consumo de substâncias (Duran & Duran ,1995; Fanon, 1967; Hooks, 1993; O'Neil, 1992). Os padrões psicológicos de internalização de opressão tornam particularmente complicado o processo de libertação, ou seja, o processo de organização e tomada de acção é dificultado por sentimentos de desvalorização, baixa auto-estima. Desta forma, é importante transformar os padrões psicológicos negativos de forma a alcançar processos de libertação.
É de salientar que não se tem como objectivo generalizar os achados mas referir que alguns destes padrões podem surgir em indivíduos ou grupos que tenham experimentado formas de opressão.

Processos e práticas envolvidos na libertação

Os processos que conduzirão à libertação, de acordo com a psicologia da Libertação, envolvem a transformação do dano psicológico associado com a opressão e empoderamento dos indivíduos em trabalharem colectivamente de forma a alcançarem a mudança em três níveis: facilitar o desenvolvimento pessoal com o objectivo de transformar os padrões de opressão internalizada; potenciar o envolvimento colectivo e comunitário por parte dos indivíduos; empoderar os indivíduos e grupos na tomada de acção de forma a conduzir à mudança.

Que contribuições a psicologia da Libertação poderia fornecer no Estado Novo?

De acordo com a investigação elaborada neste artigo face à análise social e o padrões psicológicos associados com a opressão, podemos inferir que processos e acontecimentos semelhantes ocorreram durante o período do Estado Novo.
Assim, a psicologia da Libertação poderia por em prática os seus objectivos que anteriormente já referimos. Aspectos como empoderamento e transformação de padrões sociais e psicológicos associados com a opressão de forma a que os indivíduos possam construir ferramentas que conduzam à mudança, facilmente seria aplicável no contexto do Estado Novo.
Porém, é de salientar que os psicólogos teriam que trabalhar em conjunto com os indivíduos sobre a alçada da opressão, o que se tornaria particularmente dificíl visto estes tornam-se mais um alvo da violência, perseguição e opressão que o regime exercia na altura.
Contudo, penso que os contributos que a psicologia a Libertação poderia contribuir no próprio regime, como também, no pós 25 de Abril seriam inúmeros. É possível que, com a implementação das práticas da psicologia da Libertação sobre os padrões psicológicos existentes na altura, poderia ter ocorrido diferentes e melhores mudanças no pós 25 de Abril - o desenvolvimento de uma maior agregação colectiva e comunitária entre os indivíduos através da transformação da alienação e sentimento de impotência, no desenvolvimento de um sentido de tomada de acção e solidariedade.
Ainda assim, falamos apenas de possibilidades do que poderia ter ocorrido se práticas como a psicologia da Libertação pudessem ter contribuído.


(Geraldine Moane, (2003). Bridging the Personal and the Political: Practices for a Liberation Psychology. American Journal of Community Psychology, Vol. 13, Nos. 1/2)

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